domingo, 30 de março de 2014

SUMÁRIO

1- INTRODUÇÃO
2- A HISTÓRIA E A FUNDAMENTAÇÃO DO SABER
2.1- Educação da Europa para o Mundo
2.2- A Educação no Brasil
2.3- A Institucionalização da formação profissional no Brasil
2.3.1- O papel de Getúlio Vargas
2.3.2- O ensino técnico industrial
2.3.3- O SENAI
3- A REFLEXÃO SOBRE O SABER
3.1- Influência de Comte e Durkheim
3.1.1- O Positivismo de A. Comte como superestrutura ideológica no Brasil
3.1.2- O funcionalismo de Durkheim na formação profissional
3.2- Educação ou adestramento? Interdisciplinaridade eretecnia, uma visão crítica da reengenharia e qualidade total
4- A REFLEXÃO SOBRE O FAZER
4.1- Sindicalismo, ideologia marginal ? A enquete operária
4.1.1- A enquete
4.1.2- Perfil
4.1.3- Exploração
4.1.4- Qualidade
4.1.5- Consciência de classe
4.2- Radiografia
5- CONSIDERAÇÕES FINAIS
6- REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

7- ANEXOS

quinta-feira, 27 de março de 2014

2- A HISTÓRIA E A FUNDAMENTAÇÃO DO SABER.

2- A HISTÓRIA E A FUNDAMENTAÇÃO DO SABER.
    
         2.1-   Educação da Europa para o Mundo.

         Para se  compreender o processo da organização da estrutura de ensino ocorrido no Brasil é indispensável uma reflexão sobre a conjuntura que precedeu a organização social do país, na Europa como clímax na Proclamação da República, principalmente porque só tardiamente foram estruturadas  as instituições formadoras de produtores de saberes.

         A estrutura de ensino no século XVI era compostas por escolas voltadas exclusivamente para formação cavalheiresca da nobreza, de forma institucionalizada. Foi somente no séc. XVII, com inspiração da Reforma, que surgiram as escolas públicas com intuito específico de divulgar a religião.

         Com a crise religiosa, ocorrida em decorrência da Reforma de Lutero, a Igreja  Católica como estratégia de reorganização interna estrutura a ordem dos Jesuítas, segmento da Igreja, que participa do processo educador com tendência humanista preocupada apenas com a formação do ensino a nível secundário.



         No século XVIII, com o advento do Iluminismo, há o surgimento do pensamento liberal que tinha por ideal uma educação voltada a engajar os indivíduos na participação dos processos produtivos das novas organizações sociais, apesar da predominância jesuítica. Defendem os liberais que o ensino deve ser encargo do Estado, que fiscalizará e garantirá a obrigatoriedade e gratuidade no ensino elementar. Deverá também haver o enfoque nacionalista na educação, contrapondo-se contra o ensino universalista dos jesuítas, da mesma forma que o ensino do latim devesse ser suprimido pelo ensino da língua vernácula. Deveria o ensino ter uma orientação concreta e prática voltada para os estudos das ciências, técnicas e ofícios, interesses contrários ao humanismo Jesuíta.            

         A Revolução Francesa (1789) tem um caráter demolidor, sendo os pensadores posteriores a ela responsáveis pela reconstrução do tecido social. Na medida em que desorganizou todo um referencial, abriu novo espaço para a inovação de idéias. O desfecho contra a tradição, sobre todas as suas formas, questionará a monarquia. Mas também haverá uma reflexão sobre os "erros e os crimes da Revolução provando que a razão é incapaz de dirigir os homens"(Challaye, pag.230, 1978).
        
         Iniciada na França, se estendendo aos demais países europeus, indaga sobre as demais monarquias, sobre seu ideal como também sua capacidade de obter uma estabilidade social. Problemas novos suscitaram movimentos inéditos: gera-se o movimento operário, o impulso sindical, as escolas socialistas.
    
         A internacionalização dessa cultura, trouxe como consequência os movimentos liberais, as revoluções propriamente democráticas, movimentos das escolas socialistas e os nacionalismos.

         Dentro deste contesto há os intelectuais preocupados com a redefinição de rumos na organização social. O precursor, poder-se-ia dizer, foi Claude Henri de Rouvroy, o Conde de Saint-Simon, que concebeu uma idéia de "uma ciência social organizadora". "A humanidade não foi feita para habitar as ruínas"(Saint-Simon, apud Challaye, pag.230, 1978), sendo a reorganização obra da filosofia com caráter positivo. A filosofia positiva aplicará no estudo do homem e das sociedades o espírito de observação imparcial que já aplicava no estudo da matéria. A fisiologia social permitirá reorganizar a sociedade. Defende o surgimento de "um Novo Cristianismo que sirva de liame espiritual entre todos os homens, muitas vezes opostos por um patriotismo feroz e absurdo" (Saint-Simon, apud Challaye, pag.230, 1978).

         Com a revolução industrial, no séc. XVIII, houve um vertiginoso aumento da produção, alterando o antigo capitalismo liberal para um moderno capitalismo, dos monopólios, dos trustes, dos enclaves.
        
         A burguesia que sempre teve um papel revolucionário em 1848 se instala no poder na Europa. Neste momento se contrasta a riqueza claramente com os proletários que tinham jornadas de trabalho de 14 a 16 horas, inclusive para mulheres e para as crianças. É esta categoria (proletários), na perspectiva socialista, que passará a ter um papel de classe revolucionária. Há um grande momento de críticas: o liberalismo burguês, os movimentos sindicais, o socialismo utópico representado por Proudhon (1), o anarquismo de Bakunin (2), o socialismo científico de Marx  e Engels (3).

         Acompanhando o processo de internacionalização das relações sociais, com o mercantilismo, capitalismo, e a revolução industrial, houve uma urbanização acelerada no séc. XIX, sedimentando uma estrutura que definiu tipos de trabalhos diferenciados, e que  passou a exigir mo de obra cada vez mais especializada para utilização nos processos. É neste momento em que o Estado se manifesta como o grande interventor. Aquelas atividade nas quais se dedicavam anteriormente com exclusividade os obreiros e artesos (contratados pela coletividade, ou pelos "senhores" com responsabilidade administrativas de pequenos centros), construtores de pontes, portos, estradas, catedrais, obras para a coletividade em geral, é reivindicada pelos estados absolutistas. Agora têm também a responsabilidade pelo gerenciamento da formação profissional de artífices para estes novos encargos urbanos, funcionários públicos administrados pelas elites oligárquicas, mantendo a hegemonia do bloco histórico. E a influência positivista neste momento é determinante.


                                                 
1- Pierre Joseph Proudhon (1809-1865),quando manteve seus primeiros contatos com os socialistas," começou a desenvolver teorias sobre um sistema sem governo, baseado numa organização econômica cooperativista e na liberação do crédito da agiotagem que a controlava"(Woodcock, pag.354, 1981). Seu livro póstumo, "De la Capacité des Classes Ouvrières", forneceu a base teórica para o anarco-sindicalismo. Bakunin chamava-o de "Mestre de todos nós".
2- Michael Alexandrovisch Bacunin (1814-1876) produziu uma obra escrita vigorosa, mas muito mal organizada. Ele próprio confessou a Alexander Herzen (1812-1870), que no tinha qualquer noção de arquitetura literária, e só muito raramente conseguia concluir qualquer trabalho mais longo que um artigo. sobre seus escritos podem ser encontradas em "Michael Bakunin", de E.H.Carr (1937), "Bakunin: The father of the anarchism", de Anthony Masters.
3- Karl Marx (1818-1894) juntamente com Friedrich Engels (1820-1895) escreveu em 1848 o "Manifesto Comunista". Dentre outras, escrevem "O Capital" em três volumes, obra que ficou inacabada (1867-1894), que é o mais clássico trabalho desses socialista.



         Há uma reorganização do ensino universitário, burguês, que tinha por fim uma escola classista e
 propedêutica. O proletariado passa a ter que desempenhar aquelas atividades técnicas, para atender as necessidades das novas indústrias e do comércio. Surgem, para este fim, as escolas politécnicas e as escolas normais para formar profissionais para atuarem no magistério. Há uma preocupação por parte dos Estado em formar nos indivíduos uma consciência nacional e patriótica nos cidadãos impingindo-os ao civismo.


         2.2. A Educação no Brasil.

         No Brasil o ensino público oficial iniciou somente em 1772 sob a responsabilidade principalmente das instituições religiosas. Mas foi só no século XIX que houve uma pseudo organização da educação nacional.

         O primeiro passo foi dado quando em 1808 a Família Real, junto com toda a aristocracia, fugindo da Guerra com a França, saiu de Portugal e  aqui se instalou. Neste momento é revogada a lei que mantinha proibida a expansão portuária no Brasil, como também  o desenvolvimento de uma


incipiente indústria em território nacional. Em 1808 é fundada a Academia Real da Marinha e em seguida, em 1810, a Academia Real Militar, que sero unificadas em 1832.

         A partir de 1822, com a Independência, apesar de não haver mudança significativa, há algumas investidas, como a  por parte do Barão de Mauá,  na estruturação de indústria para a produção de navios a vapor, de estradas de ferro, bancos, telégrafos, intensificando uma vida urbana.

         A Constituição de 1834 estabelecia que o ensino de nível superior deveria ficar ao encargo do poder central, ao passo que a educação elementar ou secundária deveria ficar com as províncias, futuros estados federativos. Sem planos para o ensino, a educação torna-se cada vez mais propedêutica, voltada para preparação dos indivíduos para a faculdade.

         Num primeiro momento, o ensino secundário era ministrado por professores particulares sem fiscalização ou unidade. Com o tempo surgem os liceus provinciais que formam e diplomam no grau de bacharel, pré-requisito para o ingresso nos cursos superiores. 

         A educação no Brasil tinha então um caráter elitista e aristocrático sendo que os diplomas de graduação tinham uma conotação de " enobrecimento ", contrapondo-se com o trabalho físico, maculado pelo sistema escravista.

         De 1830 a 1890 fundam-se colégios católicos e protestantes com o predomínio da ideologia cristã. A Sociedade de Culto a Ciência de Campinas, de São Paulo, cria um colégio de inspiração positivista, sendo esta e os colégios leigos os mais progressistas e renovadores. O poder central forma escolas normais, muito fracas devida a má remuneração e ao mau preparo dos mestres, para forma-los mestres: em 1835 Niterói, em 1836 Bahia, em 1845 Ceará e São Paulo.

         Em 1856 é criado o Liceu de Artes e Ofícios do Rio de Janeiro, escolas de comércio e outras de agricultura, mas nenhuma de formação industrial. Benjamim Constant tentou substituir o currículo acadêmico por um currículo "enciclopédico", com inclusão de disciplinas cientificas. Conseguiu suprimir em parte o ensino humanístico, mas pecou ao não ter cuidado de pensar a educação como a partir de uma realidade dada. O controle do poder ainda era exercido pelas oligarquias rurais.

         A militância política e teórica  no Brasil se deu através de profissionais liberais, trabalhadores intelectuais e particularmente de militares, inserindo o país, mesmo que tardiamente, na modernidade trazida pelo positivismo.

         O positivismo e a ideologia liberal leiga exerceram grande influência para a abolição da escravatura, como também para a Proclamação da República. Com o federalismo, em 1891, há a autonomia dos estados, e um crescimento desigual com o favorecimento dos estados de Minas Gerais, São Paulo, e Rio de Janeiro, que com seus políticos se alternam no poder, daí a definição da política do "café com leite".
   "A burguesia industrial em ascensão copiava os modelos de comportamento e educação da classe latifundiária. E era natural que assim fosse, pois esta última que tinha fornecido parte de seu capital humano e econômico para engendrar o processo de industrialização. Era pois do comportamento da classe oligárquica é que ia a burguesia nascente buscar seus exemplos, e era a educação dessa que ela iria solicitar para si"(Romanelli, pag.   1985).

         O enfoque de Romanelli, e todo seu encaminhamento teórico ao longo de seu trabalho, diz respeito a institucionalização do sistema de ensino no país. Sobre outras correntes que influenciaram a organização dessa estrutura, as problemáticas regionalistas, somente sero enfocadas quando da abordagem da influência positivista. Apesar da Constituição Republicana possuir forte conotação do que se legislava no Rio Grande do Sul a nível de educação, nenhuma referência é identificada. 

         No Jornal "O Técnico" (anexo I), editado por um grupo de alunos  Escola Técnica Parobé, em 1944, Eivlys Mabilde traz dados relevantes sobre o desenvolvimento da história da formação profissional no Brasil, principalmente no Rio Grande do Sul.


   "No Brasil Império, a primeira realização no âmbito do ensino industrial, foi a fundação do Colégio da Misericórdia Pública, seminário industrial e manufatureiro, pelo Conde de Lage. Dessa instituição saíram os operários que em 1837, ensinaram no Arsenal de Guerra, aos aprendizes menores ali recolhidos, os ofícios mecânicos. Coube, porém ao Rio Grande do Sul, a honra de ter, com caráter oficial, tomando a primeira iniciativa de amparo ao Ensino Industrial, criado pela lei n  12 de dezembro de 1837, promulgada pela Assembléia Provincial, o Colégio de Artes Mecânicas."(O Técnico, n 1, Mabilde, pag.1).
  
         Note-se que nesta conjuntura que se armou na sociedade do Rio Grande do Sul, houve uma mobilização das elites e empenho em impingir à modernidade a sociedade mais geral.

   "No segundo ano da Guerra dos Farrapos, em pleno regime monárquico, numa época em que o     ensino industrial mal se esboçava em realizações isoladas, de particulares, a Assembléia da Província de So Pedro do Rio Grande do Sul promulgou uma lei de excepcional valor no só do ponto de vista educacional, como social".(O Técnico, n 3, Mabilde, pag.1).

         A Lei promulgada pela Assembléia da Província (ver anexo I, set/1944), possuía um caráter ímpar, visto que pela primeira vez em território nacional se planejava a educação como necessária a constituição de cidadãos, e de assistência social, com a preocupação do Estado com crianças carentes e abandonadas.

         Em setembro de 1944 a viso do técnico industrial é externada pela conclusão da interpretação da referida Lei pelo técnico Mabilde:

   "Cremos não exagerar dizendo que essa lei estava adiantada, no mínimo meio século pelas  razões que passaremos a expor:
a) Há nela, a preocupação de que todo o brasileiro venha a ter possibilidades educativas, mesmo os mais desprotegidos da sorte;
b) Nela procura-se elevar o ensino industrial, embora à maneira da época - ao escravo era vedada a entrada nas Escolas Superiores e, também no Colégio de Artes Mecânicas;
c) Conforme se lê no artigo 6, "será consultada a inclinação do ofício", o que é digno de especial menção, já que nessa época, a questão de pesquisa de vocações mal se esboçava mesmo nos países mais adiantados;
d) Porém, onde nossa admiração atinge ao auge, ao fazermos o exame dessa Lei, é quando associamos os artigos 7 e 3: "o produto do trabalho dos aprendizes pertencerá ao Colégio - à Província, portanto - mas, em troca, "a cada um dos moços que for recolhido ao Colégio se abonará pelas Rendas Provinciais, cento e setenta reis diários para suas despesas, por todo o tempo de ensino.
   Julgamos no ser exagero de nossa parte dizer que vimos encontrar, nessa Lei de 1837 da Assembléia Provincial de So Pedro do Rio Grande do Sul, o embrião do que viria a ser as bolsas de estudo".(O Técnico, n 3 Mabilde, pag. 2).

         Muito pouco se fez em prol da educação do Brasil, mas foi a partir da revolução de 1930 que existem fatos concretos que definiram as diretrizes da institucionalização do ensino. Na verdade o que se convencionou chamar Revolução de 30 foi o ponto alto de uma série de revoluções e movimentos armados que durante o período de 1920 a 1964 se empenhavam em promover vários rompimentos políticos e econômicos com a velha ordem social oligárquica.

         Para Octávio Ianni foi no século XX que o povo aparece como categoria profissional fundamental. Isto ocorreu principalmente a partir da I Guerra Mundial e, depois dela fatos que definitivamente contribuíram para o ingresso do Brasil na civilização urbano - industrial.

   "O modelo de substituição de importações de produtos manufaturados - baseado inclusive na manipulação de componentes essenciais de anterior - desenvolve-se aceleradamente de 1930 a 1962. Flutua em várias direções e exige a recomposição das relações de produção e de dominação. Na forma em que foi posto em prática, isto é, com base na ruptura parcial com as estruturas arcaicas internas e externas, trouxe consigo os elemento de sua própria negação. A sucessão de crises políticas, nesse período, indica o conflito crescente entre o nacionalismo desenvolvimentista e independente e a preservação de vínculos e compromissos com a sociedade tradicional e o sistema político-econômico internacional"(Ianni, pag. 11, 1975).

         Em 1920 há um percentual de 80 % de analfabetos no Brasil, o que não queria dizer que eram ignorantes. Há uma pressão natural pelos diferentes setores da sociedade reivindicado mais profissionais com o perfil técnico para o trabalho. Em 1922 há a Semana de Arte Moderna lançando sementes que darão frutos a partir de 1930. Nas primeiras décadas do século XX a mobilização social em busca de uma ideologia nacionalista ou condições mínimas de sobrevivência, pressionou as forças políticas no poder a posturas racionais quanto ao encaminhamento de projetos para o país.

         Vargas teve uma formação política fortemente marcada pelos ensinamentos e atuações positivistas de Júlio de Castilhos e Borges de Medeiros, modernizadoras. Segundo Laclau (1985), dentro das correntes totalizantes no campo político que determinaram a orientação da organização social na América Latina, o liberalismo e o positivismo polarizaram. O populismo teria sido a forma de defesa legítima encontrada pelas massas populares latinas de alcançarem alguma modernidade e justiça social. Desta forma no Brasil, Vargas, com um positivismo populista, implementou inovações técnicas, reformas políticas, e transformações econômicas, sob uma pressão capitalista e liberal.  De 1930 a 1940  dá-se um desenvolvimento do ensino que jamais se registrara no pais.

   "O sistema liberal no era mais encarado como uma ferramenta de progresso e homogeneização social, mas sim como um simples sistema de dominação. Esta é a base a partir da qual o populismo emergiu como uma nova matriz do imaginário político. Duas características principais merecem ser comentadas. Primeiramente, enquanto o ponto de fechamento do imaginário liberal era um horizonte fornecido por uma pura lógica de diferença, este horizonte, no caso do populismo, era constituído pela afirmação da divisão social e pela lógica da equivalência. A dimensão totalizante do social é instituída através de oposições básicas do tipo: "povo/oligarquia", "nação/imperialismo etc. Em segundo lugar, esta dimensão imaginária define pontos cruciais em torno dos quais o novo horizonte político se organiza: o líder, as Forças Armadas, ou o apelo do conhecimento técnico e do desenvolvimento econômico. O populismo em outras palavras, permanece um discurso da totalidade do social, que define uma fronteira entre as forças sociais cuja relação de equivalência constitui o campo popular e as outras forças sociais, simetricamente opostas, que representam o campo de dominação" (Laclau,pag.17, 1985).


         Em 1933 haviam em todo território Nacional um total de 133 escolas de ensino técnico industrial, total que aumentou para 1368 em 1945, segundo Loureiro Filho. Em 1937 são formados os primeiros profissionais licenciado para ensinar no ciclo secundário.

         Apesar desta modernidade conservadora os movimentos sociais emergentes neste momento no Brasil é que tentaro pressionar para que leis de caráter mais popular fossem aprovadas. Os ajustes da decretação até à instrumentalização era de uma morosidade institucional que até sua publicação no Diário Oficial as forças homogeneizadora do poder hegemônico na sociedade já haviam se mobilizado no deixando vingar a contra ideologia popular sendo o Estado a nova ferramenta da classe dominante.

         Portelli, ao referir-se a Gramsci, coloca bem como se dá este processo:

   "O esquema em função do qual Gramsci raciocina, ele próprio o reconhece, é o de um período histórico determinado, o do Estado liberal, do Estado-guardião. Esse aparelho, puramente voltado para a dominação política e coerção, limita-se estritamente a essa atividade exclusiva. A sociedade civil (ideologia, cultura) é abandonada as diversas organizações privadas, particularmente à Igreja que, através de concordatas, vê garantido para si um domínio reservado no seio da sociedade.
   Gramsci nota, porém, os sinais de uma estatização da sociedade civil. A estatização aparece, em primeiro lugar, com o declínio dos órgãos clássicos de expressão da sociedade civil no seio do aparelho político, em proveito de um controle direto do Estado: declínio dos partidos parlamentares tradicionais, vinculado ao do parlamento, monopólio do Estado sobre os novos órgãos da opinião pública e tentativa de estatização dos antigos (Gramsci inclui aí, particularmente os sindicatos) etc. Essa estatização revela-se, igualmente, na absorção progressiva de educação e cultura, até então confiada a organismos privados - entre os quais a Igreja - em proveito de "serviços públicos intelectuais".
   O caso mais característico é o da educação, por diversas razões que Gramsci destaca:
- necessidade de um controle do Estado a fim de incrementar o nível técnico-cultural da população e responder, assim, às exigências do desenvolvimento das forças produtivas;
- conflito entre os intelectuais tradicionais (particularmente a Igreja), vestígios do antigo bloco histórico, e os intelectuais da classe dominante;
- necessidade de unificar a ideologia difundida pelas organizações da sociedade civil" (Portelli, pags. 34-35, 1990).



         Após 1930 com a era Vargas, o Estado Novo influenciado pelas doutrinas totalitárias imprime forte controle estatal, inclusive nas indústrias privadas. Depois da 2 Guerra Mundial, começa a Segunda República que foi de 1945 até 1964. O populismo, fenômeno típico na América Latina, encontra fértil terreno nas classes populares, resultante da industrialização e insatisfeitas com as condições de vida e de trabalho.

         Durante a ditadura de Vargas, o ministro Gustavo Capanema empreende novas reformas do ensino, regulamentadas por diversos decretos leis assinados de 1942 a 1946 e denominadas Leis Orgânicas de Ensino. Em 1942  a Lei Orgânica 4073 cria o Ensino Industrial; a Lei 4048 cria o Serviço Nacional da Indústria (SENAI). O país passava por um grande desenvolvimento industrial e a importação de técnicos estrangeiros achava-se comprometida pela guerra, o que exigia uma solução nacional para o problema. Estas Leis criam dois sistemas paralelos de ensino profissional onde um é mantido pelo sistema oficial e outro organizado e mantido pelas empresas (Confederação Nacional das Indústrias).


         2.3- A Institucionalização da formação profissional no Brasil.

         2.3.1- O papel de Getúlio Vargas.

         No Brasil a idéia de planejamento como instrumento de desenvolvimento econômico foi primeiramente adotada pelas elites revolucionárias de 1930. Este movimento de modernização destacava a modernização política como instrumento capaz de levar o progresso econômico e social generalizadamente. Com ingredientes ideológicos de apôio à industrialização, como meio de criar uma sociedade moderna, participante e profissional, o Estado encontra certos obstáculos advindos da falta de uma prévia experiência histórica com a modernização em geral, com a formação profissional e cultural. Dirigida por uma aliança de forças militares nacionalistas e facções dissidentes da aristocracia agrária, apoiados por incipientes industrialistas sob a diversificação de seu aparato produtivo, é iniciado o projeto de Getúlio Vargas.

   "Agricultores operosos, carentes de crédito oficial, indústrias de pequeno e médio porte estabelecidos nas cidades maiores e uma crescente classe assalariada vindos com as grandes migrações européias passaram a constituir pólos de necessidades e projetos, não raros, opostos aos velhos e ganaderos. Que estilos ideológicos poderiam então responder às exigências dessas novas camadas sociais ?"(Alfredo Bosi, 1992, apud, Figueredo, pag. 74, 1995).
   "Bosi mostra como o positivismo comtiano continha os ingredientes de uma política progressista, intervencionista, planejadora, etc. e como estes ingredientes foram sendo incorporados aos programas políticos e econômicos das principais lideranças riograndenses" (Figueredo, pag. 74, 1995).

         Foram criadas diversas instituições para auxiliar na consecução de certas metas econômicas. No ano de 1934 o Conselho Federal de Comércio Exterior encarrega-se de estudar e propor recomendações práticas relativas ao comércio exterior e incentivos para a incipiente indústria nacional, assim como decidir sobre a criaço de outras instituições preocupadas com agricultura, minerais, matérias-primas, matérias para a indústria bélica, etc.

   "Como parte da mesma tendência intervencionista, uma decisão política crucial em realço ao mercado de trabalho e às realces de trabalho foi tomada em 1930 através da criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio. A política trabalhista foi complementada em 1943, com a publicação do Código do Trabalho. Estas duas medidas enquadraram um período que presenciou fortes ondas de repressão contra o movimento nacional de trabalhadores, através das quais o movimento foi posto sob completo controle do Estado. Além da regulamentação da força de trabalho durante este período, o governo criou muitas outras instituições designadas para tratar com problemas originais, seja da evolução das forças produtivas, seja da manutenção das estruturas agrárias tradicionais. Em particular, relações entre cafeicultores e emergentes industrialistas foram responsáveis por pressões em favor de subsídios industriais, como modo de desenvolver a economia nacional através da contínua acumulação de divisas estrangeiras, necessárias para incentivar o modelo de industrialização por substituições de importações (Schmidt,pag.89 e 90)".

        "No contexto desta atividade envolvente do Estado, as técnicas de planejamento começam a ser assinaladas pelos funcionários do governo. Mais ainda, as constituições federais de 1934 e 1937 expressaram princípios gerais favorecendo o nacionalismo e o intervencionismo estatal. Estes princípios podem ser interpretados como consistentes com a idéia de criação de um modelo de desenvolvimento capitalista autônomo, através do fomento de uma industrialização fomentada pelo Estado"(Schmidt,pag.90).


         Sob a perspectiva de Gramsci Vargas trabalha bem a questão da hegemonia do bloco histórico na medida em que aprova leis que atenderá as expectativas mais imediatas de uma grande massa. Dá avanços na legislação trabalhista porque  sabe que em tempo hábil será modificada e que também servirá de teto (limite) para avanços trabalhistas. Veja-se a lei n 23.569 de 11 de janeiro de 1933 (ver anexo IV), regia  o exercício das profissões de engenheiros, arquitetos e agrimensores. Sua publicação no Diário Oficial da Unio seria somente no fim do mesmo ano. Em 1941, pelo decreto de n 3.995, de 31/12/41, reforça a burocracia desta estrutura criando as contribuições, obrigatoriedades e penalidades para um adequado funcionamento desta estrutura.

         O processo produtivo necessitava de profissionais com um perfil adequado para a indústria e é com esse enfoque que cria a lei n 4.073 de 30 de janeiro de 1942 (Lei Orgânica do Ensino Industrial - Anexo V), como uma forma comteniana de homogeneizar o conhecimento, no território nacional, gramsciniano e weberiano, como forma de disciplinar uma ideologia, via escolas,  com um autoritarismo burocrático. Será comentado mais adiante para Romanelli, essa lei, porém sob outro enfoque.
    
         Como esses profissionais provinham de classes inferiores a da oligarquia hegemônica, finalmente, em 10 de janeiro de 1946 sob o decreto lei n 8.620 (anexo VII), que regulamenta o funcionamento do CREA (Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura), atrela o técnico industrial, limitando seu desenvolvimento ao sistema formado por profissionais de nível superior.

         Como tentativa inicial dos técnicos de desvencilharem-se da organização legal, ideologizante do bloco histórico, em 1947 fundam a Associação Riograndense dos Técnicos Industriais, demonstrando maturidade de profissionais que desde a época das Escolas Politécnicas, reconhecidas pelo Governo Federal (anexo III), já vinham se organizando como categoria.

         Segundo Romanelli, entre os feitos do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, cujo primeiro titular foi Lindolfo Collor, teve de saída o decreto reduzindo a imigração de trabalhadores. No ano seguinte, novo decreto regulamenta o funcionamento dos sindicatos, cuidando sobretudo de conciliar empregados e empregadores em nome da paz social. Numerosos outros decretos reguladores da organização sindical, do trabalho de menores e da mulher, do regime de horário, da carteira profissional, da organização previdenciária, do salário mínimo foram postos em vigor; logo surgiu a necessidade de reunir tudo isso num corpo codificante. No dia 1º de maio de 1943 o decreto lei nº 5.452 institui a Consolidação das Leis do Trabalho cujo artigo 511 é o texto básico da sindicalização atual, combinado com os artigos 541 e 570 a 577. A CLT adotou a bifrontalidade sindical inspirada no corporativismo fascista (nacionalista, comprometido com a política de estado), com a diferença de que aqui a sindicalização é dupla, quer dizer, de trabalhadores e de empresas produtoras de bens e serviços. Nesse sentido a lei permite a existência de duas categorias elementares: a categoria profissional, reunindo  empregados, agentes, ou trabalhadores autônomos ou liberais, à base de interesses específicos, afins ou conexos; e a categoria econômica, compreendendo as empresas empregadoras, de acordo também com a identidade, a similaridade ou conexão.


   "Naquele momento, empresas do setor privado no estavam preparadas para absorver capital e tecnologia para melhorar a produtividade, e assim pressionar o governo a agir com políticas planejadas. O planejamento foi assumido no como uma intervenção autoritária, mas sim como um conjunto de meios para a racionalização a ser comandado pelo Estado. A fraqueza subjacente da sociedade brasileira, e o movimento favorável ao desenvolvimento econômico, eram as duas principais fontes as políticas intervencionistas do Estado.
   Deve-se notar que as pressões advindas do contexto das forças econômicas internacionais, para a expansão da produção, também jogaram com papel importante. Em síntese pode-se dizer que as características centrais da atividade estatal no período de 1930-45 eram:
a) crescente intervenção estatal através de ações regulatórias sobre a economia;
b) modernização político-administrativa da estrutura do País, criando as base de uma burocracia moderna, centralmente operada pelo Executivo  e operando de acordo com os critérios racionais;
c) formulação de uma ideologia global de Estado, implementada através da ênfase nos valores nacionais e na modernização"(Schmidt, pag. 92).

         Foi a partir de 1946 que se inicia um período marcado por políticas econômicas liberais. Houve a entrada de capitais estrangeiros para instalarem indústrias no país.

         No governo de Gaspar Dutra há políticas de absoluto ``laissez faire''. Pressionados pelos exportadores agrícolas e pelo capital estrangeiro, Dutra implantou uma desastrosa política de comércio exterior que trouxe as reservas estrangeiras do Brasil ao colapso. Esta política estava coberta pela constituição de 1946, que no previa a existência de nenhuma agência de planejamento central. Entretanto, o código do trabalho, inspirado no fascismo e promulgado no Estado Novo, continuou a ser cumprido como maneira de controlar o preço da força de trabalho e as políticas dos sindicatos.

          Dutra fez uma genuína tentativa de implementar o liberalismo econômico. Entretanto, a despeito de seus alegados princípios liberais, o governo foi forçado a intervir na economia em 1947-49, pois as reservas estrangeiras do Brasil tinham quase acabado.

          Durante aquele período foi implantado um sistema de controle de câmbio: o Plano Salte. Este foi um programa destinado a tratar com investimentos públicos em áreas de saúde, produção de alimentos, transporte e energia. Parte de um projeto governamental apresentado em 1949 e aprovado em 1950 compreendia investimentos em diversas áreas num período de cinco anos. Quando G. Vargas retornou ao poder em 1951 ele tentou implementar o Plano Salte, mas somente após algumas modificações, tais como o deslocamento do DASP como autoridade executiva em lugar de uma autoridade específica (o gerente geral do plano). O movimento de Vargas, no sentido de adaptar e implementar o plano de Dutra, pôde ser tomado como o início de um processo mais geral que resultou na colocação de instituições mais estáveis designadas para a gerência de planos de governo dentro de suas próprias esferas de decisão (4).

         Esta  reflexão, desenvolvida até aqui tem por objetivo apresentar a conjuntura em que se processou o desenvolvimento da economia, os meios de produção e os métodos de intervenção administrativa do Estado no início do século, para conseqüente abordagem da organização dos trabalhadores no processo da construção do saber nacional.



         2.3.2. O ensino técnico profissional
    
         Procurando deixar claro o contexto em que se deu a institucionalização do processo de ensino no Brasil, Romanelli, tanto quanto Arruda, deixam de enfocar traços determinantes na constituição da estrutura de ensino em locais onde houveram significantes focos de tenso e de instabilidade social no século passado.

         Configurando-se esta realidade político administrativa, os responsáveis pelas questões públicas quer sejam representantes do governo central, quer sejam revolucionários, deram um diferenciado tratamento para as correntes educacionais adotadas, principalmente no caso do Rio Grande do Sul (5).

         O ensino comercial ficou organizado com um só curso básico de quatro anos de 1º ciclo e vários cursos técnicos de três anos de 2º ciclo. Foram os seguintes os cursos técnicos: comércio, propaganda, contabilidade, administração e secretariado. Para os empregados do comércio sem habilitação estavam previstos cursos de especialização para quem tivesse formação na área.

         O ensino agrícola tem, igualmente, sua organização baseada em dois ciclos: o básico, agrícola de quatro anos e o de mestria, de dois anos, no primeiro ciclo, e vários cursos técnicos de três anos, no segundo ciclo, como o de agricultura, horticultura, zootecnia, prática veterinária, indústrias agrícolas, laticínios e mecânica agrícola. Previa a lei ainda a existência de três tipos de cursos pedagógicos: o de economia rural doméstica, de dois anos; o de didática de ensino agrícola e o de administração de ensino agrícola, ambos de um ano.


         2.3.3. O SENAI

         Foi baseado na natureza do homem, O Leviatã, que o Estado, a partir de Vargas, reivindica para si o direito de estabelecer um governo civil, legitimado por determinismos ideológicos, migrado da Europa para países periféricos, juntamente com imigrantes que para cá vinham. Projetos absolutista, do ocidente capitalista, instrumentalizavam-se como forma de conter os possíveis avanços do socialismo insurgente no oriente (URSS).

         E foi Max Weber quem forneceu todo um referencial teórico que definiu a hegemonia desta nova conjuntura com o poder determinado economicamente:
        
   "A lei existe quando há uma probalidade de que uma ordem será mantida por um quadro específico de homens que se utilizaro de compulsão física ou psíquica com a intensão de obter conformidade em relação à ordem ou de aplicar sanções à sua violação. A estrutura de toda ordem legal influencia diretamente a distribuição do poder, econômico ou de outra natureza dentro da respectiva comunidade. Isso se aplica a todas as ordens legais, e no somente à do Estado. Em geral, entendemos como poder a possibilidade de um homem ou de um grupo de homens realizar sua própria vontade numa ação comunal, mesmo contra a resistência de outros que participem da ação"(Weber, apud Velho, pag 61, 1981).


         Antes das Grandes Guerras (6), configurava-se o país como fornecedor de matérias-primas começando a orientar-se no sentido de fornecer produtos manufaturados. E para isso, necessário se fazia uma regulamentação burocrática eficiente e legítima representada inclusive pelos integralistas e nacionalistas.          
                               
4-   "Na primeira metade dos anos 50, que corresponde quase inteiramente à presidência de Vargas, o padrão de acumulação intentado para a economia brasileira fundava-se numa prévia expansão do setor produtor de bens de produção, que poderia fundar as bases para uma expansão industrial mais equilibrada   entre os três departamentos básicos: o produtor de bens de produção, o produtor de bens de consumo no duráveis, e o produtor de consumo de bens duráveis. É deste ponto de vista que se entende o bloco de atividades produtivas, que se materializam sob a forma de empreendimentos estatais, consubstanciados na criação da PETROBRÁS, na entrada em operação da Companhia Siderúrgica Nacional, na tentativa em pôr em funcionamento a Companhia Nacional Alcalis, na já modesta performa-se da Companhia do Vale do Rio Doce e no projeto da ELETROBRÁS, enviado ao Congresso Nacional e apenas aprovado dez anos após. Este conjunto de atividades produtivas, com exceção da ELETROBRÁS, na verdade foi formulado como projeto ainda nos anos da ditadura de Vargas, com a ressalva de que o projeto da PETROBRÁS finalmente aprovado pelo Congresso Nacional em 1953 diferia em muitos aspectos, de suas anteriores formulações.
     Esse padrão de acumulação intentado e parcialmente realizado no surgiu do nada. É fato conhecido que a ditadura de Vargas propôs ao capital norte-americano a implantação do que viria a ser a Companhia Siderúrgica Nacional; e, se a forma de tomadas de decisões prévias revestiu-se de sigilo, nascendo ou passando por instâncias das próprias Forças Armadas - o caso da luta do Gen. Horta Barbosa no Estado-Maior do Exército pela criação do monopólio estatal do petróleo -, isto se deu muito mais pelo caráter ditatorial do Estado Novo do que a uma suposta casta burocrática que fazia as vezes de consciência da burguesia nacional. Em verdade, o surgimento dos projetos , que depois se materializariam sob a forma de empreendimentos produtivos do Estado, obedece a uma dupla determinação: a ruptura entre a economia nacional e o capitalismo internacional deflagrada pela Grande Recessão abriu o espaço econômico por onde se afirmou a expansão industrial, cortado durante toda a República Velha pela hegemonia do café. Ao contrário das economias capitalistas realmente maduras, onde a recessão deu-se exatamente nos setores industriais, a indústria nacional entre 1933 e 1938 experimentou taxas de crescimento real da ordem de 11 % ao ano, o que, sob severas condições de crise cambial e logo após pela eclosão da Segunda Grande Guerra, cortava-lhe a possibilidade de abastecer-se, para sua expansão, no exterior, de bens de capital e de bens de produção. Assim, é essa expansão - e a contradição a que vai dar lugar, tendo em vista o estado das forças produtivas dos países imperialistas sob a recessão e em seguida submetidos a economia de guerra - que determina a expansão do setor de bens de capital e a própria implementação dos projetos estatais de base, sem o que a reprodução do capital industrial no seria factível" (Oliveira,pag. 77, 78 e 79).
5-   "Neste contexto (ao referido por Schmidt e Oliveira), regulamentou-se o ensino técnico profissional. As Leis Orgânicas que estruturaram o ensino técnico profissional durante o período começaram a ser promulgadas em 1942. Na ordem que se seguem, elas foram decretadas de forma gradativa:
a) Em 30 de janeiro de 1942, o decreto lei nº 4.073 organizava o ensino industrial (Lei Orgânica do Ensino Industrial);
b) em 28 de dezembro de 1943, saia a Lei Orgânica do Ensino Comercial, pelo decreto lei nº 6.141;
c) e em 20 de agosto de 1946, findo portanto o Estado Novo, saía o decreto lei nº 9.613, chamado Lei Orgânica do Ensino Agrícola (Romanelli,pag.160). 
     "Esses três decretos leis organizaram o ensino técnico profissional nas três áreas da economia, de forma que ele contivesse dois ciclos - um fundamental, geralmente de 4 anos, e outro técnico, de 3 a 4 anos. No que concerne ao ensino industrial, além do industrial básico de 4 anos, existia, no mesmo ciclo, o curso de mestria, de 2 anos. Já o 2º ciclo possuía, além dos cursos técnicos de 3 a 4 anos, o curso de formação de professores (pedagógicos) de 1 ano. Ao lado desses cursos de formação, estavam previstos na lei cursos artesanais, de duração curta variável, e os de aprendizagem. Os primeiros destinados a dar treinamento rápido, e os de aprendizagem, destinados a qualificação de aprendizes industriais. Nesse sentido, merece realce um aspecto importante contido no decreto e que por isso transcrevemos aqui. Seu artigo 67 rezava o seguinte:
     Art.67- O ensino industrial das escolas de aprendizagem será organizado e funcionará, em todo o país, com a observância das seguintes prescrições:
     I - O ensino dos ofícios, cuja execução exija formação profissional, constitui obrigação dos empregadores para com os aprendizes, seus empregados.
     II - Os empregadores devero, permanentemente, manter aprendizes, a seu serviço, em atividade cujo exercício exija formação profissional.
     IV - As escolas de aprendizagem sero localizadas nos estabelecimentos industriais a cujos aprendizes se destinam, ou na sua proximidade.
     XII - As escolas de aprendizagem daro cursos extraordinários para trabalhadores que no estejam recebendo aprendizagem" (Romanelli,pag. 161).
     "Este é um aspecto de indiscutível valor da história do ensino profissional, pois revela uma preocupação do Governo de engajar as indústrias na qualificação de seu pessoal, além de obrigá-las a colaborar com a sociedade na educação de seus membros. Esse fato decorreu da impossibilidade de o sistema de ensino oferecer a educação profissional de que  carecia a indústria e a impossibilidade de o Estado alocar recursos para equipá-lo adequadamente. Ademais é conveniente lembrar que a época existia uma redefinição da política de importação de pessoal técnico qualificado, como vinha acontecendo até então. A guerra estava funcionando como mecanismo de contenção da exportação de mão de obra dos países europeus para o Brasil. Até essa altura, não existira uma política adequada de formação de recursos humanos para a indústria, porque esta vinha se provendo de mão-de-obra especializada, mediante importação de técnicos. O período de guerra estava dificultando esta importação, do mesmo modo que dificultava a importação de produtos industrializados. Isso suscitava um duplo problema para o Estado: de um lado, ter de satisfazer as necessidade de consumo da população com produtos de fabricação nacional (portanto, acelerar a substituição de importações) -o que significa ter de expandir o setor industrial brasileiro e, com isso absorver mais mão-de-obra qualificada - e, de outro lado, já no poder contar com a importação desta, pelo menos no mesmo ritmo em que ela se processava. Daí o recurso para o engajamento das indústrias no treinamento de pessoal. Esse recurso terá seu desdobramento com a criação do SENAI, tratado mais adiante (Romanelli,pag.161)".
6-   "O país acaba de enfrentar, na década de 1930, uma de suas grandes crises econômicas. Com ela, abandonava-se gradativamente a forma tradicional de industrialização e passava-se, rapidamente, para a fase em que predominava o modelo de substituição de importações. A economia de guerra do início da década de 1940 impunha sérias restrições às importações e, com isso, impulsionava o processo de industrialização. A nova fase de expansão da indústria exigia, portanto, que algumas medidas fossem tomadas no sentido de preparação da mo de obra. O sistema educacional, todavia, no possuía a infra estrutura necessária à implantação, em larga escala, do ensino profissional. Tampouco as classes médias, que faziam crescer a demanda social de educação, estavam realmente interessadas no ensino profissional de grau médio. A organização do ensino médio profissional continuou, pois, apesar das reformas, a arrastar-se lentamente, sem uma expansão capaz de atender às necessidades do desenvolvimento. A indústria, por sua vez, exigia uma formação mínima do operariado, o que teria de ser feito do modo mais rápido e mais prático. Recorreu, pois, o Governo à criação de um sistema de ensino paralelo ao sistema oficial, que foi organizado em convênio com as indústrias e através de seu órgão máximo de representação - A Confederação Nacional das Indústrias. O decreto-lei 4.048, de 22 de janeiro de 1942, criava, então, o Serviço Nacional de Aprendizagem dos Industriários, mais tarde Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), destinado a organizar e administrar escolas de aprendizagem industrial em todo o país, podendo também manter, além dos cursos de aprendizagem, que eram mais rápidos, segundo a Lei Orgânica do Ensino Industrial, tinha por objetivo a preparação dos aprendizes menores dos estabelecimentos industriais, cursos de formação e continuação para trabalhadores no sujeitos à aprendizagem.
     A lei estipulou que o SENAI seria organizado e dirigido pela Confederação Nacional das Indústrias e mantido pela contribuição dos estabelecimentos industriais a ela filiados (públicos e privados).
     Completando a regulamentação da matéria, o Governo baixou ainda dois outros decretos-lei. O primeiro de nº 4.481, de 16 de julho de 1942, dispôs sobre a obrigação de os estabelecimentos industriais empregarem aprendizes e menores num total de 8 % correspondente ao número de operários neles existentes e matriculá-los nas escolas mantidas pelo SENAI. Neste caso, a Lei exigia prioridade para os filhos, inclusive os órfãos e irmãos, de seus empregados.
     O mesmo decreto estipulou que essas escolas seriam de dois tipos: as estabelecidas junto às próprias empresas e as mantidas pelo sistema oficial de ensino. Nelas os cursos de aprendizagem deveriam conter disciplinas de formação geral, de formação técnica e de prática das operações do ofício.
     Além do mais, esse decreto-lei orientava que os cursos destinados à formação dos aprendizes funcionassem no horário normal de trabalho, sendo os alunos obrigados à freqüência dos curso em que estivessem matriculados (Romanelli, pag. 166)". 
     "O outro decreto-lei, de número 4.436, de 7 de novembro de 1942, ampliava o âmbito da ação do SENAI, determinando que sua rede de escolas profissionais atingisse também o setor dos transportes, das comunicações e da pesca. Determinava ainda que essas escolas passassem a ministrar, além dos curso de aprendizagem, o ensino de continuação, aperfeiçoamento e especialização, o que significava uma ampliação de duas ordens: em primeiro lugar, quanto aos setores de produção, a qualificação de pessoal em várias áreas de trabalho, tendo como conseqüência uma diversificação maior dos seus cursos; em segundo lugar, a ampliação, quanto aos níveis dos cursos, com a inclusão do aperfeiçoamento e especialização e, portanto, com a possibilidade da reciclagem profissional e da formação de professores" (Romanelli, pag 166 e 167).

     "Como o Estado começasse a interferir mais profundamente no processo de industrialização, assumindo o encargo de promover a industrialização relativa ao setor básico, decidiu ele competir, pelo decreto-lei nº 4.984, de 21 de novembro de 1942, as empresas oficiais, que possuíssem mais de 100 empregados, a manter, por conta própria, uma escola ou sistema de escolas de aprendizagem destinadas à formação profissional de seus aprendizes, e ao ensino de continuação e de aperfeiçoamento e especialização de seus demais trabalhadores, podendo essas escolas, para efeito de administração de seu ensino, articular-se com o sistema de escolas do SENAI (Romanelli, pag.167)"